sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Por que as pessoas se incomodam tanto com os Los Hermanos?

Do Blog do Matias


Estamos em mais um “momento Los Hermanos'', aquela época imprecisa em que Camelo, Amarante, Bruno e Barba se reúnem para lembrar sua curta discografia frente a milhares de devotos apaixonados em diferentes cidades pelo Brasil. E sempre neste momento surgem aqueles dispostos a esbravejar contra a existência da banda, como se quatro cariocas fazendo um som fossem ameaçar a vida de alguém.
É impressionante como as pessoas se incomodam com tudo – não apenas com os Los Hermanos -, quando a única coisa que eles precisam fazer é não dar atenção para o que lhes incomoda. É tão simples. Mas preferem esbravejar contra tudo e todos: o último capítulo do seriado que todos assistem, o filme mais esperado, o sucesso sertanejo da vez, o show transmitido pela televisão, E isso, como qualquer coisa hoje em dia, é amplificado pela internet. Não bastasse a grita do maniqueísmo ideológico desta década, que reduz tudo a prós e contras, “o meu time contra o seu time'', e a histeria em torno de qualquer assunto banal, ainda temos que aguentar resmungões que desatinam textos enormes contra modismos e paixões apenas para juntar likes e reunir outros reclamões nas caixas de comentários para repetir variações de “é isso aí!''.
Pois o grupo carioca surgiu justamente como uma antítese a esse pensamento de manada. Lá no fim dos anos 90, quando ainda era um sexteto de rock que tocava para meia dúzia de gatos pingados no Rio de Janeiro, eles tinham tudo para dar errado: eram uma banda de rock numa cidade cuja cena de rock se desfazia, cantando letras românticas sobre bases hardcore, tentando achar um meio termo entre Weezer, Mr. Bungle e Nelson Cavaquinho, olhando para o mangue beat como inspiração para recriar uma música carioca que fosse ao mesmo tempo moderna e reverenciasse as tradições da cidade. Eles tinham um saxofonista na formação! Enquanto o Rio de Janeiro reinventava-se à base de funk carioca, Fausto Fawcett e Fernanda Abreu, deixando para trás todo o bucolismo praiano da bossa nova, os Hermanos tentavam achar um fio da meada entre o apartamento de Nara Leão e o selo indie Midsummer Madness, entre o início das escolas de samba e o então decadente carnaval de rua da cidade.
Ninguém apostaria que a banda daria certo – tirando eles mesmos. E aquela convicção começou a arregimentar curiosos, que aos poucos viravam fãs e começavam a espalhar a notícia no boca a boca. Logo seus shows começavam a encher a ponto de chamar atenção das gravadoras, que ainda não tinham sucumbido à era do MP3. O grupo lançou seu primeiro disco em 1999 após criar expectativas com duas fitas demo e conseguiu alguma repercussão logo de saída. Mas foi a simplicidade Jovem Guarda de uma das músicas menos cotadas do disco de estreia (“Anna Julia'', claro) que pegou outros artistas de jeito e a música logo era sucesso no repertório dos trios elétricos baianos que, começando a viver mais uma crise sazonal da axé music, se ancoraram no hit carioca para bombar o primeiro carnaval dos anos 2000.
Qualquer outra banda surfaria naquela onda de sucesso, mas os Hermanos não estavam querendo só fazer sucesso. A banda havia sido formada para fugir da mesmice e agora via-se pautando a própria mesmice da vez. A principio tirou a música do repertório dos shows, mas o sucesso acendeu a luz amarela para a banda e eles se retiraram em um sítio para compor o novo disco – preocupados em não virar caricaturas de si mesmos.
E lançaram três discos que mudaram a cara do pop nacional. Se você acha que o cenário musical brasileiro se afunila na versão hi-fi do funk carioca e no sertanejo que aprendeu o modus operandi da axé music (isso é sinal que você está ouvindo rádio demais e assistindo muita TV), saiba que este cenário seria bem mais agressivo caso os quatro cariocas não tivessem fugido do sucesso e criado o oásis para seus fãs composto por O Bloco do Eu Sozinho (2001), Ventura (2003) e 4 (2005). Foi essa trilogia de discos que preparou o terreno para que artistas como Céu, Tulipa Ruiz, Marcelo Jeneci, Tiê entre outros, pudessem florescer, reunindo diferentes linhas de frente da nova música brasileira, como a geração pernambucana pós-mangue beat, o rock gaúcho e o rap menos gangsta. Até o lado mais experimental desta cena foi contemplado, quando grupos como Hurtmold e Cidadão Instigado foram convidados para abrir os shows da banda. Se o Los Hermanos não tivesse se voltado para o samba, para uma tradição brasileira e para o que eles realmente queriam fazer, o pouco que haveria sobrado do rock nacional seria um misto de viúva dos anos 80 com um arremedo dos anos 90, uma mistura de Capital Inicial com Charlie Brown Jr. com saudades da MTV Brasil.
Mas essa separação de gêneros musicais é secundária. O grande legado do grupo foi ter criado seu próprio canto, seu porto seguro musical inclusive do ponto de vista da sobrevivência comercial da banda – ela não precisa mais estar na ativa, lançar discos todos os anos ou entrar em turnês constantes para pagar as contas. Cada um deles segue sua vida fazendo o que quer até a hora em que se juntam para reencontrar os fãs – sem nunca ter que terminar com a banda nem perder a amizade. Eles não voltam a tocar no rádio e não precisam aparecer na TV – continuam fazendo o que querem, para alegria de seus fãs. Podem até, se quiser, gravar um disco de inéditas – carta na manga que devem estar guardando para o momento exato. Mas mostram que não precisam estar na crista da onda o tempo todo, insistindo em aparecer, em todos os lugares, entupindo nossa visão com músicas e imagens.
Quem faz isso são seus fãs. E se você não gosta nem do grupo nem de seus fãs, talvez possa aproveitar ao menos uma lição deixada pelo grupo: deixa pra lá. 


OBS do Chico Águas: É inegável a relevância e a qualidade da Banda. Porém ficar reunindo sem material novo, apenas tocando músicas antigas (mesmo sendo belas canções), a banda cada vez mais fica parecida com uma banda de auto cover! 

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